Cada passo, cada hora, cada momento. Concentra-te neste manto de cores que irão ser transformadas numa imagem. Imagem tua, que só tu lhe consegues dar vida pela arte. Pinta, sentindo a poesia com cores, e transparece num momento de raiva magoando o papel…
Que te fez ele para ser objecto da tua mente?! Rasga-o se conseguires, mas não publiques toda esta dor só tua. Capta agora a imagem de gaivotas sobrevoar a fina areia de uma praia deserta onde já houve amor.
Não penses que estás ser criativo, muito menos original. Quem nunca desenhou uma árvore, obrigado como desenvolvimento de criança que todos nós fomos?! Quem nunca chorou às escondidas ao ler um poema de amor?!
Pára de fingir que não és artista e que todos esses olhares são a raiva constante do que te crava nessa tela interior.
Afinal tu és aquele de quem tu tanto falas. Quando passo à tua frente na rua tu nem me olhas. Porquê? Porque estás prestes a captar uma nova imagem, vítima à tua arte!
Só vais levar da tua arte tudo aquilo que mereces, porque já não há heróis, sobredotados ou mágicos sem ser conspurcados. Mas sim, ainda existem artistas, que só não o são porque não admitem que acreditam numa outra forma de poesia, num outro tipo de talento transformado em arte.
Bem-vindo ao mundo do imaginário! Mas cuidado, nem tudo o que parece é: o sono não são sonhos, adormecer não é descansar. A arte não é amena… na arte não há sonhos, há poesia por se terem vivido pesadelos. A única tatuagem é a que te rompe o coração, e acredita que gostava, mas ninguém pode mudar o alento de um artista.
Se ao menos pudesses explicar o que são os teus rabiscos ou amontoado de cores. Mas não expliques… cada palavra de poesia é explicada somente por cada um dos olhos que a lê.
São assim os artistas puros, sem ideias feitas. Com teorias escorridas sobre coisas da vida perfeitas. Não procures a perfeição, o artista será eternamente imperfeito. Em enredos enfadonhos, dá-se por ele “pensar”, mas pensamentos para o artista serão perpetuamente sonhos.
Estás condenado a uma missão de vida: os actores corrigem-te, mas não sabem que quando andas na rua, falas com as pedras da calçada, e são os bancos vazios de gente que te inspiram.
Pensa um bocado: arriscas dar uma resposta para tudo, acabando por achar ainda mais questões. Ganhas o jogo muito antes do fim, e a vida que te inspira são rimas de linhas que todos assimilam como loucura.
Mas ser artista é mesmo isso: ter coragem de ser genuinamente louco.
Tens o poder nas tuas mãos, mas surgem telas ou cadernos num guardanapo do café. A esplanada é a única companhia... e isso basta entre uma andante multidão.
Há quem diga que procuras drama ou amor, podes-te achar contador de histórias ou revelador de memórias. Por vezes inglórias, quase sempre notórias: és aluno e professor. Nem melhor, nem pior.
És tu: o artista, paciente e doutor, curas assim a tua própria dor. Com muito ódio, dando e revelando concórdia e amor.
Podes até ser julgado por não teres moral, porque presunção e soberba só ficam mal! Podes até saber muito bem do que falas, mas acomodas-te ao silêncio para evitar a sentença final.
Na tua mente és consciente, ciente, irreverente, mas politicamente, isso será mesmo activo, ou é apenas delírio da tua mente?!
É bom a inspiração de uma música, mas acusam-te de plágio por seres sensível ao que apenas tocou o que já estava lá dentro.
Podes usar roupa debotada porque te apetece, e acharem que te queres é mostrar um ser socialmente diferente. O problema é mesmo esse: as críticas por nem sequer teres um ideal e o teu mundo ser tudo, menos real. Desamparas a loja porque tens mais que fazer, sentes que não vales a ponta de nada, e descobres novos rótulos para “gente”.
Escondido num quarto, dás numa de duro. Mas eu sei que pesado não és tu. Porquê? Porque és artista. Durante toda a tua vida vão-te enrolar na tua arte e talento, e rebentarem-te como um canhão. Porque para toda a acção formal, serás sempre pobre, e consequência da tua própria frágil reacção.
Quando um dia te encontrarem realmente, vão conseguir falar de homem para homem. Ou de artista para homem que busca a verdadeira arte.
Não acertas em nada ao escuro, nem fazes ideia do que seja drama a sério.
Pinta apenas com as cores que são só tuas, esses rabiscos parvos aos olhos dos outros.
Porque sim, és mesmo artista.
E o verdadeiro artista armado em purista será sempre punido…
E a hora da sentença será sempre “A morte do Artista!”